03 julho, 2010

Caro Dunga, por Juremir Machado da Silva, ou sobre o enfrentamento dos podres poderes na mídia e no futebol



O belo texto abaixo (em vermelho), do Juremir Machado da Silva, publicado no jornal Correio do Povo deste sábado, 3 de julho de 2010, expressa quase tudo o que penso e sinto sobre esse assunto:  o desempenho de Dunga frente ao comando da seleção brasileira de futebol e sua inegável coragem e determinação no 'enfrentamento' da mídia dominante.

Entendo que o técnico não só enfrentou a mídia e o poder global, recusando-se a permitir que a Globo fizesse uma matéria (não agendada e nem combinada previamente) para o "fantástico", que iria ao ar na semana passada, com os jogadores e equipe brasileira, como, também, com suas declarações acerca da necessidade de isolamento e privacidade da equipe, afrontou o próprio imaginário hegemônico brasileiro, ou seja, aquele que é notoriamente masculino, machista e sexista.

Um pouco desalentador entender que a hipocrisia é necessária para se vencer na vida. Ainda acredito que é possível dizer, fazer e corajosamente, marcar diferença. Mas, claro, vencer no sentido instituido, ligando-se aos poderes dominantes e fazendo o papel de bobo da corte, dizendo amém para quase todos... aí fica mais fácil.

A maior vitória de Dunga foi - e é - as sementes de diferença que plantou nos usos do poder.
Uma micropolítica, feita com ou sem a sua intenção, mas que foi suficientemente intensiva para abalar crenças e acirrar os ânimos... dos babacas... de plantão.  

Discordo do Juremir no que concerne à torcida pela Argentina e pelo Maradona. Fiquei muito satisfeito com a eliminação dela hoje, pela excelente seleção alemã.
It's time to cry Argentina!
E desejo e espero que "eles", os hermanos, revejam seus valores. 

Definitivamente não me abalei pela desclassificação da seleção brasileira. Torcia por ela e pelo Dunga, pelo que eles significavam, de diferença. Apesar disso, houve vitória.
Vitória da contestação e da aposta, sempre inovadas, em optar por não ser vaca de presépio.
Um golpe bem dado, frontal e certeiro, na hipocrisia.

Tem algo de Lula... nisso.
Adoro!

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Caro Dunga

Minha solidariedade, Dunga. Tu foste genial. Eu me tornei definitivamente teu fã. A eliminação contra a Holanda não abalará em coisa alguma a minha admiração. Tu és ingênuo, Dunga. Quiseste ganhar com base na seriedade, na lealdade e no caráter. Tiveste a coragem de dizer sempre a verdade e de enfrentar os mais poderosos. Cometeste erros, Dunga, mas isso é normal. Só os cretinos imaginam fazer tudo certo. Deixaste de fora alguns meninos talentosos, Dunga, e o velho Ronaldinho Gaúcho. Tiveste boas razões para isso. Tu havias ganhado tudo com o grupo que levaste à Copa. Desejavas valorizar os teus comandados e vencer ou perder com eles. És um capitão de navio à moda antiga. Aceitaste afundar com teu navio. Tua vitória teria sido uma revolução nos costumes. Que pena!
É verdade que não apostaste na beleza. Outros, no entanto, ganharam sem beleza alguma e tampouco sem tua valentia e tua nobreza rude. A derrota foi o resultado de alguns erros que podem acontecer com qualquer um: um gol contra de Felipe Melo, uma agressão boba de Felipe Melo, que determinou sua expulsão, e a perda do controle emocional pelo time todo. O mesmo Felipe Melo, entretanto, deu o lindo passe do gol do Robinho. Estiveste a um passo da glória, Dunga. Agora, voltaste, apesar dos triunfos anteriores, a ser um desgraçado, um maldito, um desprezado. Conheço isso, Dunga. Por mais que tu venças, serás sempre um perdedor. É tua sina. Os donos do mundo não suportam a tua franqueza, que chamam de arrogância. Detestam tua simplicidade, que rotulam de grossura. Odeiam tua transparência, que os impede de conceder privilégios e de fazer negociatas na tua cara.

Foste um exemplo, Dunga. O mundo, porém, não está preparado para a tua vitória. Espero que esteja para a de Maradona, técnico antagônico e complementar a ti, mas não acredito. Tomara que eu me engane. Foste bravo, Dunga, impávido, colosso. Não mandaste Felipe Melo pisar no adversário. Buscaste o equilíbrio. Apostaste no talento de Kaká e Robinho. Sonhaste com a beleza. Ela não sorriu para ti. A mídia te condenou por não teres feito o jogo dela. Viste o jogo como um jogo e tudo fizeste para alcançar os teus objetivos. Não compreendeste que o jogo é também um teatro no qual alguns devem sempre figurar nos camarotes. Até o teu sotaque incomodou, Dunga, neste país onde os que debocham do teu sotaque têm sotaques tão ou mais caricaturais. Tiveste personalidade, Dunga. Isso é imperdoável. Há muita gente feliz agora. Teus inimigos podem sorrir triunfantes e sentenciar: "Eu não disse...".

Nós, os ruins, os ressentidos, os malditos, os perdedores, apesar de todas as nossas vitórias, estamos contigo Dunga. Somos os teus representantes por toda parte. Tinhas razão, Dunga: boa parte da mídia estava dividida, torcendo pelo Brasil e, ao mesmo tempo, te secando. Para vencer neste mundo, Dunga, é preciso aprender a ser hipócrita. Tu nunca conseguirás. Tuas vitórias serão sempre laboriosas. Tuas derrotas te marcarão mais. Tu, ao contrário de outros, não te escondes jamais. Aceita, caro Dunga, meus cumprimentos.


JUREMIR MACHADO DA SILVA > correio@correiodopovo.com.br

Um comentário:

Kátia disse...

Um exemplo de coragem e independência frente a Vênus Platinada!!!

QUE SE LEVANTEM MAIS “DUNGAS”!
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