14 outubro, 2010

Dilma e Serra: polêmicas e busca de votos, ou sobre "A questão do aborto" e "O novo eixo do mal"






Já FUI militante do PT. 
Não sou mais.


Essa campanha à Presidência da República no Brasil, anda batendo às portas da Idade Média, quando se colocava na fogueira os livros, os escritores, os cientistas e os antagonistas de todos os tipos, que não concordavam e/ou não se submetiam aos ditames da Igreja.
Também bate às portas do período Guerra Fria, quando expressões com "comer criancinhas" e "matar criancinhas" eram prática comum para designar comunistas e socialistas, tentativas de imputar e criar medo nas pessoas...

Que a Dilma não tem o carisma do Lula, Do Mercadante, do Olívio Dutra, do Tarso Genro, da Maria do Rosário, só para citar alguns, é evidente.
Aliás, é minha opinião que ela não tem carisma nenhum... aqueles olhinhos pequenos, com aquele sorriso quase forçado... . chega a dar uma certa desconfiança... à primeira vista.

Olhando e observando um pouco mais e se detendo, no entanto, às falas, ao conteúdo do discurso, no tom de voz e principalmente às propostas da coligação que oferece Dilma como candidata, pelo PT, essa primeira impressão some, quase que por encanto. 

Isso, me parece ainda muito mais verdadeiro, quando fazemos o mesmo com Serra, que, ao contrário da Dilma, tem uma ótima "aparência" inicial e vai se desmanchando completamente à medida que se observa a voz, o conteúdo - e a ausência dele - do discurso e as propostas de governo com mais atenção. É DEMAGÓGICO. Em excesso.  E tem excesso de demagogia. Ora vai construir trens e metro no país inteiro em quatro anos... o que é isso?
Aquele sorrisinho aberto e aqueles olhos expressivos... querendo passar a idéia do menino bomzinho e comportado... do político popular e amado pelo povo... hummmm... comecei a pegar nojo.
Todo aquele que quer aparentar - desejo de imagem - ser MUITO bonzinho, comportado, querido, sorridente... o tempo todo, modulando a voz para sustentar essa imagem ... é um perigo. 
Desconfio sinceramente dessa criatura.
Não só desconfio. Literalmente, não confio.

Dizer que "Serra é do Bem" é o mesmo que insinuar que Dilma é do mal, aliás, era isso que os mega republicanos Bush, pai e Bush filho, à época presidentes dos EUA... diziam sobre si próprios. O eixo do mal era Sadam Hussein no Iraque e Bin Laden no Afeganistão.Os "terroristas" eram os outros. Sempre os outros é que são incompetentes, inexperientes,... enfim.
Refrescando a  memória, vale lembrar que nas campanhas eleitorais anteriores, em todas as que Lula participou, também diziam que ele não tinha sido eleito para nada e que não poderia ser presidente do Brasil, já que, além da inexperiência parlamentar, ele era ignorante, pobre, nordestino e metalúrgico.

Essa é uma prática discursiva que retarata uma visão de mundo onde existe antagonismo frio e permanente entre bons e maus, entre experientes e inexperientes, entre homens e mulheres, entre , entre, entre.
Ora, isso é fascista.
Podre. Nojento. E discriminatório...

A propaganda do Serra na TV me dá asco. Ojeriza.
Supor que Dilma não foi eleita para nada e que, portanto, não tem condições de ser presidente da República é o mesmo que dizer que um recém formado não pode iniciar um trabalho porque não tem experiência; é o mesmo que dizer que uma pessoas com 30 anos de experiência administrativa não pode iniciar outra atividade "não administrativa"; é o mesmo que dizer que um médico dermatologista não pode ter caspa ou desenvolver uma alergia na pele; é o mesmo que dizer que um psicólogo não pode ter problemas na sua vida.
É a lógica da contralógica. É a lógica da inversão.É uma lógica perversa e sádica.

A questão importante não é essa, mas sim o fato de que a experiência é construída de múltiplas maneiras, através de muitos caminhos, de desvios, de inesperados.
Além do que, ter experiência é condição muitas vezes necessária, mas não suficiente, de que algo se saia bem e conforme o esperado e desejado.
A turminha do PSDB deveria ler e estudar um pouco mais de filosofia para aprender a pensar a política de uma forma mais aberta e menos sectária. Menos dogmática.Há um artigo em que Edgar Morin, por exemplo, que fala sobre As Insuficiências da Experiência e sobre O Desconhecido do Conhecimento... rs

Serra tem bastante experiência em cargos eletivos e  fez o quê com ela?
Colocou polícia de choque em cima de professores que estavam fazendo paralisação e reivindicações legítimas, apoiadas por órgão de classe social e legitimamente constituídos. Também usou gás lacrimogenio e jatos de água para afastar os manifestastes, segundo soube. Isso só para citar um exemplo. Aliás, o mesmo aconteceu aqui no RS no governo na Ieda Cruzius... também desse abjeto PSDB.

Repudio fortemente a propaganda eleitoral do Serra quando fica mostrando mulheres grávidas à meia luz
dizendo que ele é favorável à vida. Só falta ele colocar imagens de crianças mortas e ou achadas em latas de lixo e dizer que é isso que a Dilma quer, quando não... apontar ela como responsável!
Acontece que isso seria óbvio demais. A tática de"dizer-não-dizendo" e de subliminar estímulos que tentam inviabilizar o raciocínio são mais eficientes. Que nojo.

Que ambos os candidatos estão "fazendo o jogo" da mídia para atender as complexidades que envolvem uma eleição presidencial, é inegável.
Jogo por jogo, eu prefiro o da Dilma, que é mais e melhor jogado porque mostra as cartas, define as regras e convida a participar do jogo, diferente do jogo do outro candidato, que faz tudo ao contrário disso. Aliás, acho que é ainda pior do que isso, pois já que ele diz ser do bem e possui A VERDADE, possivelmente ele nem considera estar jogando. Deve ser intriga da oposição. Certamente é.

E é por esse tipo de dissimulação, em parte, que meu voto vai para a Dilma. 100% certo e convencido.
Já fui militante do PT. Já cantei Lula lá. Já andei com bandeiras na mão. Já chorei muito pela confiança e pelas mudanças que acreditava, seriam feitas no Brasil sob seu governo.
O Brasil melhorou muito sob a governo Lula e com a moeda, o Real, criada no governo FHC, que Lula continuou e incrementou. Nunca na história brasileira o Brasil foi tão bem visto e respeitado no exterior.
Também já me desacreditei, frustrei e sofri com alguns dos escândalos sob o governo PT.
Mas a confiança voltou e a vontade de acreditar em mais e melhor para nós também
Dilma consegue me emocionar e fez despertar, novamente, a esperança, que muitos tentaram, e continuam tentando, desmoronar.
Nunca fui filiado ao PT e nem a partido nenhum, importante dizer: gosto da liberdade que essa ausência institucional permite.
Mas, além disso, também tenho memória. Tivemos 16 anos seguidos de governo PT  em Porto Alegre e, verdade seja dita, NUNCA a cidade esteve tão bem em todos os sentidos, desde a limpeza urbana até as manifestações culturais e artísticas que foram estimuladas e criandas como nunca antes havia sido feito.
O mesmo pode ser dito acerca do Governo Olívio Dutra no estado.
É por essas e outras que voto em Dilma.
Serra jamais. Me é impossível.

Os textos abaixo, de Juremir Machado da Silva, colunista do Correio do Povo, falam por si só.

PORTO ALEGRE, TERÇA-FEIRA, 12 DE OUTUBRO DE 2010
A questão do aborto    

O aborto é legal em alguns dos mais católicos países do mundo: na Itália papista, na Espanha da Opus Dei, em Portugal e na França. É permitido também nas nações mais desenvolvidas e civilizadas do planeta: Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha, Dinamarca, Áustria, Suécia, Suíça, Noruega, Irlanda, Escócia, etc. Em geral, até o terceiro mês de gestação. Em todos esses lugares, obviamente, há quem seja contra. Em estados laicos, porém, resta às religiões aconselharem seus adeptos a agirem desta ou daquela forma. Estará o Brasil na vanguarda? Ou apenas em contradição? Dilma Roussef, para não perder votos, está sendo obrigada a renegar as suas convicções. É do jogo.

A legislação brasileira permite o aborto em dois casos. Por exemplo, se houver estupro. José Serra normatizou a aplicação dessa lei em São Paulo. Em termos rigorosamente lógicos, cabe perguntar: a defesa de uma vida permite exceções? Não seria o caso, como querem os mais extremados, de dizer que vida é vida independentemente das condições da sua geração? Parece justo afirmar que Serra é favorável só ao assassinato justificado de crianças. É isso mesmo? Ou, seguindo a tendência da Europa e dos Estados Unidos, seria mais razoável justamente o oposto, ou seja, permitir o aborto em nome da liberdade da mulher até certo momento da gestação definido pelas condições atuais da ciência? Uma coisa é certa: uma candidata ser obrigada a negar o que pensa, em consonância com os países mais adiantados do mundo, para obter votos conservadores é uma contradição.

Mais estranho ainda é que o candidato de um partido que se quer moderno, racional e sofisticado entre nessa jogada. Serra poderia ser acusado de infidelidade partidária: está trocando o PSDB pelo Dem em plena campanha. Enquanto isso, mulheres ricas fazem abortos em boas clínicas clandestinas. Jovens pobres fazem do jeito que dá. Será que há uma real preocupação com a defesa da vida nesse entrevero ou se trata apenas de uma maneira duvidosa de pegar a adversária no contrapé? O problema é mesmo o aborto ou é a manutenção de programas como o Bolsa-Família? A questão do aborto precisa entrar na pauta da sociedade brasileira um dia depois das eleições. Por que não se faz o plebiscito proposto por Marina Silva? As posições religiosas devem ser respeitadas e entrar no debate. Mas é a sociedade que deve decidir.

O jeito como a questão do aborto entrou nesta campanha eleitoral só pode ser rotulado de uma forma: baixaria. Prova de que na hora do pega para capar, como dizemos, qualquer método é válido. Já vimos esse filme. É a política do terrorismo simbólico. A opção de Dilma Rousseff parece pragmática: dar um passo atrás, constrangida, para quem sabe dar dois passos à frente. A de Serra parece o oposto: dar um passo à frente para talvez dar dois passos atrás. Uma sociedade aberta precisa decidir sobre temas que antes eram tabus: aborto, casamento de homossexuais, liberação das drogas. Quanto a este último item, Serra está atrasado em relação a Fernando Henrique? Será por isso que fica longe dele?


PORTO ALEGRE, QUARTA-FEIRA, 13 DE OUTUBRO DE 2010
O novo eixo do mal 

A mídia de São Paulo é uma piada semipronta. É só dar um calor para passar do ponto. O Estado de S. Paulo brada aos quatro ventos que está sob censura judicial em favor de um filho do imperador do Maranhão, o marimbondo meio moribundo José Sarney. O Estadão tem razão em protestar. Mas, na semana passada, demitiu a psicanalista Maria Rita Kehl por um grave delito de opinião: ela publicou um artigo defendendo o Bolsa-Família. Viva a liberdade de expressão! Alguns dias antes, o mesmo Estadão, que volta e meia defende o jornalismo isento, abrira seu voto para José Serra. Achincalhado na Internet, o Estadão deu uma de Estadinho: enrolou. Kehl não teria sido demitida. Só convidada a não falar de um assunto bem pouco oportuno neste momento: política. Uau!

A conversa fiada evoluiu para algo assim: a rotatividade de colunistas é grande. Por fim, a casa caiu. Maria Rita Kehl confirmou sua demissão. O Estadão que demitiu Maria Rita é o mesmo que vive tentando assustar as velhinhas com uma suposta ameaça de ditadura, com censura à imprensa, pela esquerda brasileira, especialmente se Dilma, rotulada de "mal a evitar", for eleita. O que significa isso? Que o Estadão é um jornal  reacionário, autoritário e desesperado. Teve medo que Maria Rita Kehl elegesse Dilma Rousseff com a sua imensa capacidade de formar a opinião dos leitores. O mais engraçado é ver e ouvir os serristas tentando justificar a atitude do provinciano jornalão paulista. A tese deles é muito sofisticada: ela teria passado dos limites. Uau!

A Folha de S. Paulo não quer ficar atrás. Convenceu a Justiça a bloquear um blog chamado "Falha" de S. Paulo. Torrou uma velha piada. Censurou o humor. Até parece a legislação eleitoral brasileira. Veja, Falha e Estadinho querem ter o monopólio do insulto, da ironia e da censura. Será que o Brasil jamais terá jornais nacionais? Veja, Falha e Estadinho formam o novo eixo do bem. O bem deles tem cara de mal para a maioria. São mais xiitas, fundamentalistas e radicais do que o Irã, a Al-Qaeda e o Bin Laden. Estão em cruzada contra o comunismo que não existe mais e contra o Bolsa-Família, programa que cria nos mais pobres um vício terrível: comer. O Estadão botou luto na sua capa quando morreu um dos mais nojentos ditadores da América Latina, o asqueroso Augusto Pinochet. A Falha de S. Paulo, ao final da ditadura brasileira, precisou mudar de cara para apagar o seu comprometimento com o regime.

O jornalismo vive de mitologias divertidas. Roberto Marinho, pilar da ditadura, que o ajudou a edificar a Rede Globo passando por cima das leis, foi biografado por Pedro Bial como um verdadeiro e hábil resistente ao arbítrio verde-oliva. O Estadão adora posar de censurado pelos brutamontes de 1964, instalados nas redações armados de tesoura, publicando Camões e receitas de bolo no lugar dos textos ceifados. Valeria uma receita de bolo de fubá no lugar da Maria Rita. A liberdade de expressão é total na Veja, na Falha e no Estado: basta estar com Serra em defesa do bem universal contra o mal vermelho.

Juremir Machado da Silva | juremir@correiodopovo.com.br

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